Moço, eu não quero
dinheiro não
Tô sem nada, menino.
Não é pra pagar nada não,
eu só preciso que vc me dê uma letra, se puder
Que?
Uma letra, senhor. Por
favor...
Pq uma letra? Você quer
um recorte do meu jornal?
Não, senhor. Eu queria uma
letra. É que, meus pais, passaram a vida trabalhando na roça. Então eu os
ajudava, e não tive tempo de ir à escola. Se o senhor puder me dar uma, talvez
um dia eu junte o bastante para poder escrever meritocracia.
- Oi, amor.
- Oi, xuxu.
- Meu denguinho, sabe o que eu queria
te pedir?
- O que, meu docinho?
- Um vestido novo, meu bb.
- Bebê não tem dinhelo pa
compa ropa pocê.
- Mamãe intão num tem mais
leite na téta.
- Que cor o vestido, amor?
Era noite, ele andava para
os lados e olhava, assustado, cada sombra que passava pela parede.
Ele estava preso, como num
mito das cavernas, mas não por medo. Ele estava preso às ruas.
Morava nelas, conhecia
elas como ninguém. Seus cheiros, seus atalhos, onde encontrar um bom lugar para
descanso, todas as belezas da natureza. Mas era noite. Tudo escuro, nada para
os sentidos aproveitarem além da sensação térmica. E fazia frio... fazia muito
frio...